
Renato Cunha. Crédito: Masao Goto Filho.
O congresso da Associação Americana de Hematologia (ASH), que aconteceu entre nove e 12 de dezembro, marcou a consolidação das terapias com células geneticamente modificadas como principal inovação no tratamento de cânceres que afetam o sangue nos últimos anos. Considerado o maior evento de hematologia do mundo, este ano o encontro aconteceu, presencialmente, na cidade norte-americana San Diego (EUA). Em meio aos avanços científicos para controle de diferentes tipos de tumores hematológicos, o CAR-T, terapia baseada em células T de receptores de antígenos quiméricos (do acrônimo em inglês CAR), que deu origem ao nome, reforça seu protagonismo.
A tecnologia vem transformando o combate ao câncer hematológico. A cada ano, novas pesquisas consolidam os resultados em diferentes tumores sanguíneos. “Impressiona o surgimento de novos resultados ainda mais promissores a partir dessa alternativa terapêutica, que consiste em usar células do próprio paciente e geneticamente modificá-las para combater o câncer. Se tornou possível habilitar células de defesa do corpo com receptores capazes de reconhecer o tumor e atacá-lo de forma contínua e específica. O portfólio de tratamentos e drogas aumentou de forma considerável neste último ano, com respostas animadoras e bastante empolgantes”, comenta Renato Cunha, líder nacional da especialidade de Terapia Celular da Oncoclínicas.
Entre os novos estudos apresentados, o hematologista. Um dos maiores pesquisadores do assunto no Brasil, destaca sobre o Lisocabtagene Maraleucel, uma droga que consiste em células autólogas modificadas. Renato Cunha ressalta que essas drogas vivas, aprimoram o sistema de defesa do paciente para que ele promova a cura através da destruição das células. “O CAR-T é uma modalidade de tratamento que, pela sua importância, insere-se como um novo pilar na jornada de tratamento do paciente, junto com a imunoterapia, quimioterapia e radioterapia. Ela oferece uma resposta mais específica, pois trabalha de forma personalizada, guiada para tratar aquela célula, aquele câncer, aquela mutação, e não apenas de uma maneira geral, em todo o corpo”, analisa.
“Nós temos atualmente aprovados três medicamentos celulares para tratamento dos nossos pacientes com CAR-T, que é o Tisagenlecleucel (Tisa-cel), o Axicabtagene ciloleucel (Axi-cel), ambos disponíveis no Brasil, e o Liso-cel, que é mais novo. O Liso-cel passou pela fase experimental após o início dos estudos clínicos do Tisa-cel e Axi-cel, mas demonstrou uma ótima resposta ao tratamento, principalmente para Linfomas Difusos de Grandes Células, ou seja, linfomas agressivos, e também um excelente perfil de toxicidade. Então, ele une o que há de melhor em resposta com segurança. Não é à toa que tem sido bastante utilizado nos Estados Unidos e nós acreditamos que em, no máximo um ou dois anos, se tenha o Liso-cel em terras brasileiras”, comenta.
Na Oncoclínicas, os procedimentos envolvendo CART começaram a ser realizados na prática, para além do ambiente de estudos, fazendo dele atualmente um dos poucos centros de saúde já autorizados a realizar o procedimento no país. Ele lembra, contudo, que os desafios ainda são grandes. “Falta capacidade de produzir rapidamente grandes quantidades de células. Precisamos de novas tecnologias para o processamento. E esse tema está no centro dos debates na ASH 2023”, afirma. Um dos maiores desafios da oncologia é melhorar a equidade no acesso ao tratamento de câncer no mundo. O Brasil, pela sua diversidade geográfica e socioeconômica, é um dos países que vivem esse desafio.
“Na rede privada brasileira, a diferença em termos de acesso, sobrevida e tratamentos, para os países mais avançados, não é tão grande. Mas o grande desafio aqui é que essas inovações cheguem ao SUS, não só para diminuir a nossa defasagem para países europeus, principalmente, mas também porque são tratamentos que melhoram muito a qualidade de vida dos pacientes. Muitas pesquisas são feitas apenas com pessoas brancas, ou seja, as drogas e tratamentos acabam sendo desenvolvidas para uma genética específica. Faz-se muito importante que tenhamos medidas que possam fazer com que os estudos clínicos realizados sejam, de fato, representativos da nossa população”, reforça Renato Cunha.
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